18.10.07

Caetanear #7


Caetano Veloso - Cê Ao Vivo, Coliseu do Porto, 16-10-07

Mesmo tendo perdido a conta à quantidade de concertos do Caetano já assistidos, o impacto causado por todos eles é quase sempre o mesmo - uma emocionante sensação de surpresa, como se da primeira vez se tratasse.
De disco para disco, o baiano não para de se reinventar, evitando encostar-se demasiado à sombra do sucesso, e criando espectáculos que, mais do que um fiel reflexo dos discos, são uma oportuna extenção criativa.
Num cenário desenhado (novamente) por Hélio Fichbauer, com quatro bastões suspensos, em constante mutação cromática, simbolizando os quatro músicos em palco, e um inspiradíssimo jogo de luzes a completar o grafismo, Caetano fez-se acompanhar pelo jovem power trio que o ajudou a modelar o seu ultimo trabalho, um trio bem representativo do actual rock vanguardista brasileiro – Pedro Sá na Guitarra, Ricardo Dias Gomes no baixo e teclas, e Marcello Calado na bateria.
Como não podia deixar de ser, o concerto incidiu essencialmente sobre Cê, um disco que reflecte uma vincada ruptura a nível pessoal (fim conflituoso de um relacionamento) e a nível artístico. É mais um grande álbum de transição/evolução, no qual o corte radical é dado pelo mergulhar, com pés e cabeça, na modernidade do indie rock, um óptimo contraponto para a complexidade da sua poesia.
Assim aconteceu com Transa, ao qual faz ligação directa em “Nine Out Of Ten” e “You Don‘t Know Me”, assim aconteceu com Velô, aproveitando para unir passado e presente de forma indissociável, através da sequência “Homem Velho” e “Homem”.
Com Caetano, em equipa que ganha mexe-se sempre, mas desta vez, foi um completo restart.
Pondo totalmente de lado, a classe (deliciosamente) açucarada dos últimos tempos, optou antes pelo choque frontal, criando um espectáculo tenso e cru, despido de artifícios mas cheio de garra, destilando sexo por todos os poros.
A base do alinhamento é a mesma do CD ao vivo que retrata a actual tournée (com alguns acrescentos), aproveitando a favorável contextualização da fase roqueira de setenta.
Começou com os actuais “Outro“ e “Minhas Lágrimas”, cobriu “Chão da Praça” (de Morais Moreira) revisitou clássicos como “Nine Out Of Ten”, “Sampa” e “Como 2 e 2” (popularizado por Roberto Carlos), os quais vestem na perfeição o rejuvenescido tratamento indie, agradeceu os ensinamentos de Morelenbaum em “Um Tom”, introduziu um tema novo, o gay friendly “Amor Mais que Discreto” e proporcionou o momento mais divertido e surrealista do concerto, pondo a plateia a cantar a plenos pulmões, “odeio você”, o refrão de “Odeio”.
Após uma breve conversa, uma pausa ao violão (para satisfação da velha guarda), na qual interpretou, em falsete, “Cucurrucucu Paloma” e “Estranha Forma de Vida”. Voltou suavemente à carga com “Um Sonho”, e foi subindo o tom, alternando temas de Cê como “Musa Híbrida”, “Não Me Arrependo” (com o sample de Lou Reed), o provocador "Porquê?" e “Rocks", com outros da fase londrina como os brilhantes “London London” e “You Don't Know Me”.
Muito felizes, são as roupagens dadas a "Fora Da Ordem" e a “Desde Que O Samba É Samba”, especialmente nesta última, construída sobre uma discreta alternância de solos, é óbvio o genuíno prazer e entrosamento que os quatro têm em palco.
No encore, o desenquadrado “Menino Do Rio”, foi compensado por "Descobri Que Sou Um Anjo" (de Jorge Ben) e por uma nova dose de “Odeio”, com direito a coro reforçado da plateia.
Pelo meio, entre pulos e correrias, ainda houve disposição para simular um stage diving que se transformou numa descida de palco para um aperto de mão a toda a primeira fila.
Mais uma vez, surpreendente.



"Outro"

"Nine Out Of Ten"

"Homem"

"Amor Mais Que Discreto"

"Odeio"


Mais vídeos aqui.
Excerto da sessão de lançamento de "O Mundo não é Chato", em Serralves, aqui.

(Z&C)

12 comentários:

Anónimo disse...

Caetano, mais uma vez, grandioso!

Vou guardar os vídeos religiosamente, Hugthedj!

Anónimo disse...

é isso aí...
obrigado por youtubarem, demais!

Anónimo disse...

Odeio Você, Cae!

:)

Hug The DJ disse...

:)

José Miguel Neves disse...

gd reportagem como sempre! Um dia ainda vais receber uma medalha...

Hug The DJ disse...

Olha quem fala!
:)

José Miguel Neves disse...

já agora, faltou o "estou-me a vir" como prova do momento mais "põe mais e alto e desliga" da noite ;-)

Hug The DJ disse...

Pode ser que ainda o ponha no tubo...

Carlos Lopes disse...

Dificilmente uso o termo "amigo" para quem não conheço. Mas é o que sinto agora que descobri o seu blog. Tudo bem escrito, com bom gosto e ainda por cima com muito Caetano. Devo dizer que sou fã (número zero, com gosto de acrescentar) do baiano desde os meus 14 anos. Fiz 40 há poucos dias e nunca perdi uma oportunidade de o ver ao vivo. Cê foi deslumbrante aqui em Lisboa e terá sido também magnífico no Porto e em Coimbra.
Calculo que tenha todos os discos dele, mas se não for assim tenho todo o gosto em mandar-lhe um cópia dos que não tiver. Há alguns mais difíceis de encontrar, com Onqotô, por exemplo. Esteja à vontade. Quem ama assim o Caetano, merece tudo.
Um abraço.

Hug The DJ disse...

Obrigado pela empatia.
Ainda vamos ter que formar um grupo de apoio...

:)

Carlos Lopes disse...

Olá, hug the dj. A propósito do comentário que deixou no meu blog sobre "Então Tá Combinedo", não posso ajudá-lo... Não tenho essa gravação. O meu stock de Caetano agrupa apenas (e já são tantos, felizmente...) os lançamentos originais. Também tem as bandas sonoras? Tieta, Meu Tio Matou Um Cara, Coronel e o Lobisomem e outras mais onde com um tema ou outro o "velho baiano" vai participando? E as Box (40 anos Caetanos) que estão a sair no Brasil? Já sairam duas até ao momento.

Obrigado pelo elogio ao blog. Volte sempre. Eu já tenho o seu nos favoritos e aparecerei por lá diariamente.

ps: por acaso não tem gravações de concertos, bootlegs ou coisas afins em som de qualidade interessante/sofrível?

Carlos Lopes disse...

Desculpe... Queria dizer "lançamentos oficiais" e não "originais", como já deve ter percebido.